Encontro Nacional de Mulheres com Deficiência encerra com propostas para fortalecer políticas públicas
Programação contou com painéis, apresentações culturais, rodas de conversa e a elaboração da Carta de Mulheres com Deficiência, além de sugestões para orientar políticas públicas e ações governamentais. | Foto: Michelle Carola/MDHC
Organizado pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), o Encontro Nacional de Mulheres com Deficiência: Protagonismo sem Limite se encerrou nessa quarta-feira (26/3) com a apresentação de propostas voltadas ao enfrentamento da violência, ao fortalecimento da participação política e à ampliação de políticas públicas para mulheres com deficiência. O documento final do evento, que deverá ser chamado de “Carta de Mulheres com Deficiência”, será divulgado em abril.

A iniciativa, que contou com o apoio da meio da Escola Nacional de Administração Pública (Enap), do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz), reuniu mais de 200 representantes de diversas regiões do país, ativistas, pesquisadoras e autoridades públicas para debater temas relacionados a direitos e inclusão.

A secretária nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, Anna Paula Feminella, destacou que o evento foi organizado para ser um espaço de escuta e troca de experiências. “Ao reunir diferentes lideranças, promovemos reflexões sobre os desafios para garantir direitos, com foco na equidade e na participação social. A importância deste momento está justamente na sua capacidade de apontar estratégias para transformar a realidade do nosso país, que conta com 10,7 milhões de mulheres com deficiência”, disse.

Embora representem 10% da população feminina no Brasil, as mulheres com deficiência são marcadas por grandes desafios. No mercado de trabalho, por exemplo, a renda média delas é 34% menor do que a renda das mulheres sem deficiência, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua de 2022, desenvolvida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Painéis

Durante o encerramento, foi exibido um vídeo produzido pelo Movimento Brasileiro de Mulheres Cegas e com Baixa Visão, abordando a violência contra mulheres com deficiência. Denise Santos, representante do movimento, ressaltou a necessidade de incluir a condição de deficiência nos boletins de ocorrência para garantir registros mais precisos. Também foi debatida a ausência de dados oficiais e a necessidade de acolhimento adequado nos órgãos de segurança pública. “Essa é uma luta coletiva em defesa dos direitos das mulheres”, reforçou.
No painel “Panorama da Violência contra Mulheres e Meninas com Deficiência”, a ativista Camila Aragão abordou os impactos da violência institucional e citou o caso de Sônia Maria de Jesus, mulher com deficiência em situação de cárcere e violação de direitos. “Minha trajetória é marcada por lutas que não escolhi, mas que enfrento todos os dias para sobreviver. O caso de Sônia é brutal — uma mulher com deficiência trancada, sem acesso à comunicação, sem dignidade. Isso é tortura institucional. E enquanto Sônia estiver em cárcere, nenhuma de nós estará verdadeiramente livre”, comentou.

A trajetória de Sônia foi tema de uma roda de conversa e mencionada pela médica e ativista Izabel Maior, homenageada na ocasião. “Receber esta homenagem me emociona profundamente, porque não se trata apenas de reconhecer uma trajetória, mas de fortalecer uma luta coletiva que precisa seguir firme. O caso de Sônia Maria de Jesus simboliza o quanto ainda precisamos avançar — uma mulher com deficiência, negra, que teve negado o direito à dignidade, à Libras e à convivência familiar. Se o Brasil não agir, será moralmente condenado. Seguimos em frente, porque brasileiras e brasileiros não fogem à luta.”

A coordenadora-geral de Articulação Institucional e Participação Social da Secretaria Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência (SNDPD), Isadora Nascimento, abordou a importância do cuidado como um direito e sua relação com o acesso à informação e ao suporte adequado. “Historicamente, as mulheres com deficiência enfrentam grandes desafios quando não estão politicamente fortalecidas em relação aos seus direitos. A falta de informação sobre a quem recorrer, com quem conversar, impacta diretamente no acesso ao cuidado. E quando esse cuidado recai exclusivamente sobre as mães, torna-se ainda mais difícil de lidar. Quando reconhecemos que o cuidado é um direito e que essa responsabilidade deve ser compartilhada, nos aproximamos de uma sociedade mais justa”, pontuou.
Os debates trataram da interseccionalidade e da relação entre deficiência e identidade. Sol Terena, do povo Terena, destacou a participação indígena em espaços políticos e a relevância de iniciativas que ampliam a visibilidade de pessoas indígenas com deficiência. “A participação do indígena com deficiência no espaço político tem aumentado, e eventos como esse nos ajudam a levantar a nossa voz e ser ouvidos. Ser indígena com deficiência e mulher é um ato de resistência a cada dia”, ressaltou.

Transmissão

Realizado no auditório da Enap, em Brasília, o encontro foi transmitido ao vivo e está disponível no canal do MDHC no YouTube. O evento contou com a presença da ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania, Macaé Evaristo, e foi conduzida por Fernanda Honorato, primeira repórter com síndrome de Down do Brasil.

Texto: T.A. / M.C.M.

Edição: F.T.